Apesar de todos os males causados por uma guerra, sabe-se, pelo menos, que - um dia - o terror vai acabar. Ao menos tem-se esta esperança. Ao final, apesar da contagem dos mortos, os sobreviventes irão se juntar na construção de um bairro, de uma cidade, de um país. No final, um novo governo surgirá; das cinzas surgirão escolas, casas e empregos. Da dor, virá a força para nunca mais se submeter à opressão. Dos pesadelos virão sonhos, esperanças e uma nova geração. Sofrida, mas forte e determinada. O Brasil nunca passou por uma verdadeira guerra. Talvez, hoje, fosse o caso.
Vivendo mais próxima dos países que foram arrasados pelas guerras mundiais, percebe-se melhor a grande cicatriz deixada nas famílias e na sociedade. Os costumes mudam radicalmente. Não só o sentido de sociedade e cidadania mudam, mas as simples questões como alimentar-se e vestir-se se transformam.
Como pensar em arte, escola e educação olhando para um país em ruínas? Mas é possível e foi possível, em Reggio Emilia, na região centro-norte da Itália, no pós-guerra. Ali nasceu um dos sistemas de educação infantil mais conhecidos, no mundo. Tudo a partir do nada. Da doação de algumas terras da parte de um fazendeiro, famílias juntaram as ruínas das casas e até de canhões de guerra para construir uma escola! Da construção, que envolveu inclusive as crianças, nasceu a arte. Da arte, a sensibilidade. Da sensibilidade, a humanidade. Da humanidade, o bem comum e assim por diante.
Em países onde perde-se tudo, o pouco que resta adquire um valor inestimável. É preciso reaprender o sentido da vida, o valor das coisas, das pessoas, do orgulho próprio! Tudo o que, pouco a pouco, o povo brasileiro foi perdendo sem que houvesse sequer uma guerra declarada! Sem que barris de sangue fossem derramados! Sem que milhões de vidas fossem perdidas (embora algumas milhares se vão todos os anos sem que ninguém se dê conta disso). O Brasil consumiu o brasileiro sem qualquer reação contrária! Foi uma tomada pacífica da alma de um povo. Um povo que sofreu na ditadura militar e submete-se à uma ditadura velada dos que manipularam suas mentes paradoxalmente contra a opressão!
Dia 25 de abril comemora-se, na Itália, o Dia da Libertação. Dia em que os partigiani uniram-se, em todo o país, contra o domínio do exército alemão. Em algumas cidades, este "exército", formado por jovens (homens e mulheres, alguns ainda adolescentes) resistiram e libertaram o país, antes mesmo da chegada do salvador exército norte americano! Milhares de jovens perderam suas vidas em prol de um país livre.
Já passados 65 anos daquele 25 de abril de 1945, os italianos ainda lembram seus mortos. Fazem homenagens e protestos. Relembram que o país lutou pela liberdade, pelo NÃO às atrocidades, NÃO ao racismo, NÃO à injustiça, NÃO ao abuso, NÃO à intolerância e à ditadura. Tudo o que, após mais de seis décadas do final da Segunda Guerra, muitos países ainda vivem diariamente em maior ou menor grau, porque a maldade está na humanidade e o mau é esquecido com o passar dos anos.
Obviamente muitos italianos mais jovens não se importam com o que este 25 de abril representa e é o que me preocupa. Sinaliza uma geração acomodada, alienada e enfraquecida? Espero que não! Espero que a Itália, assim como todo o mundo, continue lutando contra as raízes de todas as guerras. Que olhem ao seu redor, e principalmente dentro do próprio território, e perceba os sinais dos males se instalando, ou já instalados!
Um país onde se manipula a justiça, a imprensa, os bancos e o poder legislativo, um passo gigantesco já foi dado rumo à uma sociedade oprimida, sem direitos, triste, explorada, pobre e submissa. Um grande passo já foi dado para o fim da esperança. Um grande passo já foi dado para uma sociedade escrava.
Um grito só não faz côro. Brasileiros, uni-vos, porque outras uniões já foram feitas neste país e estão mais fortes do que nunca!
Feliz Dia da Libertação.