Algumas coisas na Itália me irritam muito e uma delas se chama Política! Tal qual em todos os países do mundo, o governo tem que ter jogo de cintura para fazer aprovar as suas medidas. E isso leva tempo. Em se tratando de Itália, leva o dobro do tempo. Felizmente, a lentidão italiana não está incomodando só a mim ou aos contribuintes, mas aos investidores também. Digo felizmente porque a Itália está precisando de um choque para sair da estagnação que se encontra e que só piora com os péssimos hábitos da política italiana.
Um comentário do economista-chefe para Europa da Jefferies International, David Owen, me fez rir. “Esperava-se uma reação mais rápida da Itália no sentido de apresentar um plano com credibilidade para melhorar a tendência de crescimento no longo prazo, mas isso não aconteceu". Rapidez é uma palavra que a Itália desconhece. Contudo, existe uma linha quase invisível entre o divertido e o inquietante.
A Itália tem a terceira maior dívida do mundo, beirando aos 120% do PIB. O primeiro é o Japão, com 220,3% do PIB (agravada pelo terremoto e pelo tsunami no início deste ano), seguido da famosa Grécia, com 138,6% do PIB no vermelho. A dívida brasileira está em 50,1% do PIB, segundo o último levantamento do Goldman Sachs. Berlusconi precisava já ter estabelecido um plano econômico decente para sair das primeiras posições deste ranking, mas não consegue. Nas últimas semanas, a proposta já mudou três vezes e acho que ainda mudará mais. Com a longa espera, o Banco Central Europeu já se arrependeu de ter comprado títulos italianos, que só ajudou a aliviar a pressão e reforçar o comodismo, dizem os especialistas.
Sem querer entrar em detalhes, porque não sou economista, apenas uma residente na Itália, algumas coisas me parecem um tanto estranhas. Dizer que não vai mexer no bolso do italiano é conversinha para tentar agradar os contribuintes que, a este ponto, não são mais ingênuos e sabem bem quem terá que pagar parte desta dívida, por mais que isso seja revoltante. Um dos exemplos é a Robin Hood Tax, que agora cairá sobre as empresas do setor energético que, obviamente, será repassada para o cidadão. Uma taxa que cai, inclusive, sobre as empresas de distribuição de gás, um serviço que já pesa muito no orçamento.
Entre as mais novas mudanças está a prisão para os grandes sonegadores fiscais. Digo grandes mesmo! Os que sonegam mais de três milhões de euros! O governo espera apertar o cerco contra a sonegação e aumentar a receita. Não a sua própria, mas a das prefeituras que terão liberdade (obrigação e interesse) em fiscalizar a sonegação e o que for recuperado irá 100% para os cofres públicos locais.
A medida veio para substituir uma proposta do governo chamada “contribuição de solidariedade”, que era um imposto de 5% para quem tem renda superior a 90mil euros por ano (7500 ao mês) e de 10% para os de renda superior a 150mil euros ao ano (12.500 ao mês). Posso garantir que já a primeira categoria tem sido uma raridade na Itália do século XXI (em 2009, 90% da população não chegavam aos 34 mil euros ao ano). Talvez tenham feito os cálculos e visto que poucos pagariam a tal contribuição e decidiram nivelar todo mundo, dificultar a sonegação para todos, com alvo principalmente no sul do país, responsável por 65,7% dos casos.
O problema é que os pequenos sonegadores pagarão mais impostos não sonegando enquanto os grandes vão encontrar outros modos de desviar os milhões. Alguém duvida?
Oficialmente, uma em cada cinco famílias na Itália não consegue chegar até o final do mês. Oficialmente! Porque uma das coisas que chamam a atenção nas ruas (e para o fisco) é a quantidade de carros e patrimônios luxuosos que não condizem com o padrão de renda. O jeito é fiscalizar, começando, pelo que tudo indica, lá em baixo no mapa.
Enquanto isso, o tempo está passando e a incerteza abala a credibilidade do país. Eu, que estou na Itália há três anos, já percebi que o italiano, em geral, é confuso e prolixo. O que se esperava de Berlusconi e das dezenas de grupos que o governo tem que contentar antes de decidir o que realmente vai fazer? Agilidade?
Talvez sim, visto a urgência da situação, mas, acima de tudo seriedade, objetividade, honestidade, coragem e determinação. E continuamos esperando.